Cápsulas do tempo

Luiz Fernando Pimentel
3 min readFeb 25, 2020

Em 2018 eu colei barbante nessas garrafas, a menor pra guardar lembranças ruins e a maior as boas. Era algo que eu precisava forçar minha mente a fazer, e entender que há mais pelo que ficar alegre do que pelo ficar triste.

Acabei de tirar todos os papéis e ler pela primeira vez todas as lembranças boas. Confesso que não fui muito disciplinado, e em mais de um ano poderia ter colocado muitas coisas a mais. Mas as que estavam ali foram suficientes pra me dar alívio e boas lembranças.

O primeiro e último beijo na pessoa que amo, a reconciliação com um amigo de infância, o nascimento do meu sobrinho que inclusive hoje completa 1 ano de vida; várias notas cheias de esperança de fechar grandes negócios e trabalhos. E li vários papéis rindo de mim mesmo e pensando: deu errado.

E dar errado é algo normal da vida, o certo seria a outra garrafa, mesmo que menor ter muito mais a revelar sobre este período que a maior. Mas ninguém gosta de contabilizar fracassos, mas sem eles eu não teria tido a oportunidade de pedir ajuda, chorar, crescer, amadurecer e seguir em frente. Mas não sei se quero retirar todos os papéis da garrafa menor, pelo menos não agora. Preciso conseguir chegar até o final deste texto.

O amor não correspondido não me matou. O aperto financeiro por não ter fechado nenhum dos negócios do final de 2018 e início de 2019 também não. Nenhuma das esperanças que se tornaram frustração também não. E nada de ruim poderia fazer isso. Viver é mais que estar feliz o tempo todo, é mais que estar plenamente satisfeito 100% do tempo, existem muitos momentos ruins e está tudo bem. É importante reconhecer a nossa parcela de responsabilidade por eles, reconhecer também quando simplesmente não fizemos nada de errado e ainda assim, deu tudo errado e seguir em frente. Sempre em frente, afinal o passado só pode ser acessado pela saudade. E a saudade é uma força até então, que desconheço qualquer possibilidade de domar.

Quando me vi tendo de viver
Comigo apenas e com o mundo
Você me veio como um sonho bom
E me assustei
Não sou perfeito
Eu não esqueço

A riqueza que nós temos
Ninguém consegue perceber
E de pensar nisso tudo, eu, homem feito
Tive medo e não consegui dormir —

O teatro dos vampiros — Legião Urbana

O fato é que a vida não espera a gente se recuperar de um “não gosto de você”, ou um “não vamos fechar negócio agora” pra trazer outros problemas e desafios. E não é prudente ficarmos paralisados em dificuldades ou esperanças que vivemos hoje. Amanhã virão outras, maiores ou menores. E isso é a vida.

Eu sempre precisei de muita atenção, sempre senti muita falta de carinho, amor ou devoção. Mas não ter essas coisas não pode me paralisar e impedir de viver.

E se há algo de bom pra lembrar amanhã, em 10 dias, ou em 20 anos, caso eu siga vivo até lá, é que viver é bom e a dor faz parte da vida. Evitar a dor é burrice. Evitar as irremediáveis desilusões, frustrações, coisas que darão errado, negócios que não serão fechados, amores que não serão correspondidos não é viver, é se isolar numa realidade paralela e inventada pelo nosso egoísmo. Alegrias e tristezas são linhas paralelas riscadas sobre uma enorme linha chamada: vida.

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